Médicos ‘prescrevem’ livros para crianças com menos de três anos
Leitura em voz alta agora é recomendação oficial da Academia Americana de Pediatria.
Especialistas do Brasil devem seguir orientação, que estimula a linguagem e fortalece as relações entre pais e filhos
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Vemos com alegria como essa recomendação da Academia Americana de Pediatria corrobora uma das bases do Projeto Optimist de Educação Infantil: a aprendizagem oportuna.
A aprendizagem é dita oportuna porque aproveita o momento da maior plasticidade do sistema nervoso, identificado pelos especialistas entre 0 a 6 anos de idade. Estudos indicam que 80% do cérebro da criança estrutura-se nos oito primeiros anos de vida.
Quando oferecemos à criança estímulos variados, numa frequência e intensidade oportunas, favorecemos a formação das conexões neuronais e a multiplicação das sinapses. A capacidade de gerar novas redes neuronais reduz-se gradualmente com a idade, passando a ser residual a partir dos oito anos de idade.
O Projeto Optimist de Educação Infantil, através de uma rica e organizada estimulação, propicia que cada criança – de acordo com suas condições pessoais – adquira níveis ótimos de maturidade neurológica e construa uma base firme para futuras aprendizagens.
Por outro lado, sabe-se que nem toda informação que chega a uma criança funciona como um estímulo. Isso ocorre somente quando a informação é considerada significativa, isto é, que produza interesse, ainda que a nível inconsciente. As ferramentas metodológicas do Projeto Optimist buscam oferecer aos alunos estímulos atrativos envolvidos num clima lúdico e afetivo.
Outro ponto que vemos com bons olhos diz respeito à leitura. O Projeto Optimist inclui como um elemento importante a leitura em voz alta de contos motivadores. Eles são o ponto de partida para o processo de letramento e alfabetização, que embora não seja exigido, ocorre espontaneamente ao longo da Educação Infantil com a maior parte das crianças que vivenciam o Projeto.
A recomendação do Projeto Optimist é que todas as leituras sejam feitas pela professora no estilo “narrador-ator”, modulando a voz e prendendo vivamente a atenção das crianças. Além disso, incentivamos a leitura em casa com as crianças, como forma de fortalecer o vínculo familiar. Pesquisas recentes têm demonstrado que as crianças se desenvolvem melhor na escola e na vida quando seus pais estão envolvidos em sua aprendizagem e disponibilizam tempo para elas. A leitura pode ser uma das boas maneiras de fazer isso.
Mais do que diversão, a leitura de histórias para os filhos pequenos, especialmente os menores de três anos, agora é “prescrição” médica.
Uma nova recomendação da APP (Academia Americana de Pediatria) diz que os médicos devem orientar os pais a lerem em voz alta para os bebês como forma de estimular a linguagem, o desenvolvimento da alfabetização e o fortalecimento das relações afetivas entre eles.
A mesma orientação deverá ser seguida pelos médicos brasileiros, segundo a SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). “Nas consultas, é fundamental que se faça esse tipo de orientação aos pais. A leitura tem papel fundamental no aprendizado e é base para todos os conhecimentos”, diz Christian Muller, neuropediatra da SBP.
A ênfase dada às crianças pequenas (até três anos) tem uma explicação: os primeiros 36 meses de vida são cruciais para o desenvolvimento do cérebro e de habilidades como falar, aprender e pensar.
Para editar a nova política, a APP se baseou em estudos que demonstram que bebês e crianças pequenas expostos à leitura têm melhores competências linguísticas quando ingressam na escola.
No Brasil, mais da metade (56,5%) dos alunos com idade de oito anos chega à terceira série do ensino fundamental sem aprendizagem adequada para a leitura. E 70% não sabem escrever corretamente, segundo dados do Plano Nacional de Educação.
A médica Pamela High, uma das autoras do estudo que embasou as orientações da APP, afirma que trazer os livros para a consulta permitirá que pediatras observem as habilidades motoras, a linguagem e a alfabetização da criança, além da interação entre ela e seus pais.
“A leitura favorece o vínculo familiar. Pode ser a oportunidade de pais e filhos estarem juntos, sem compromissos ou o relógio delimitando tempo para as tarefas diárias”, diz Christian Muller.
INTERAÇÃO
Mas nem sempre é fácil prender a atenção das crianças pequenas apenas com a leitura em voz alta, observa a pediatra norte-americana Perri Klass. “Elas não se interessam por histórias longas. Logo se distraem porque têm um curto espaço de atenção.”
Diretora de um programa nos EUA que estimula os pais a lerem para os filhos pequenos, Klass diz que os adultos não devem se sentir frustrados se a criança se desinteressar e levar o livro à boca, por exemplo. “É assim que elas exploram o mundo.”
Segundo a doutora em educação pela PUC-SP Maria Alice de Rezende Proença, professora do Instituto Singularidades, é importante que os bebês folheiem livros e os percebam como fontes prazerosas de informação.
“O adulto deve brincar com a voz, com os gestos e as expressões faciais e corporais. Ler histórias tem que ser prazeroso para ele também”, diz.
Segundo a professora Maria Alice, quanto mais cedo a criança for exposta a variados tipos de leitura, maior será o seu vocabulário e as chances de escrever com uma linguagem mais rica.
CLÁUDIA COLLUCCI DE SÃO PAULO